quarta-feira, setembro 12, 2012



A arte de convocar



Não é nada fácil a vida de um treinador de seleção. Em qualquer parte do mundo, em qualquer esporte. Imagine no Brasil e no futebol.

Conversei com inúmeros treinadores de quase todos os esportes durante minha carreira e quase todos eles falaram desse drama na hora da convocação. De como a certeza muitas vezes se transforma em dúvida. De como é difícil avaliar o momento de um atleta e compará-lo ao histórico da carreira.

Pior que a convocação, confirmam todos, é o corte. Nenhum técnico gosta de cortar atleta. Fica sempre a questão humana pairando sobre uma atitude técnica. Fora a dúvida, inevitável, ao optar por atletas muitas vezes da mesma capacidade técnica.

Quando se trata de seleção brasileira de futebol, a convocação é um assunto que, mesmo hoje, com a seleção meio em baixa no gosto do povo, palpita. Todo mundo tem sua seleção, escolheria de uma forma. Dificilmente se encontrará uma mesma seleção se for feita uma pesquisa com cem, 200 torcedores.

Além disso, a convocação mexe com a paixão clubística. Hoje mais se reclama do que se comemora uma convocação de jogador. Porque com os problemas do calendário, um jogador convocado para a seleção atrapalha seu time, deixando-o desfalcado em jogos importantes. Mesmo assim, torcedores reclamam  a ausência de determinados atletas das listas de Mano Menezes.

Convocar é uma arte. Porque envolve algo que deve estar acima das opções pessoais de quem convoca, que é o coletivo.

Treinadores vivem de suas convicções. Os melhores geralmente são aqueles que acertam mais em suas, digamos, certezas. Mas também são os que não têm medo de reconhecer quando suas convicções caminham contra as evidências.

Outra questão complicada é a administração do grupo. Em se tratando do futebol, um universo povoado de atletas mimados, super estimados e em muitos casos mascaradíssimos, fica ainda mais difícil fechar a conta. Será que vale a pena levar uma super estrela, que certamente contaminará o vestiário, mas tem condições de resolver uma partida em uma ou duas bolas? É possível controlar os egos ao ponto de que em um período curto, como uma Copa do Mundo, eles sejam deixados de lado?

Cobri muito a seleção brasileira em minha carreira e confesso: o ambiente nunca me seduziu. Cria-se uma espécie de vínculo que, embora ajude na busca por informações, pode atrapalhar na procura pela isenção e objetividade. Também existe uma grande confusão entre cobertura jornalística e torcida. Principalmente em época de Copa do Mundo.

Jamais existirá uma convocação que agrade em 100%.

Eu, assim como quem está lendo esse texto, todos temos nossas preferências. Por exemplo, eu convocaria Fred e Diego Cavalieri, e não convocaria Carlinhos e Fábio Santos. Mas acho que chamar jogadores jovens e talentosos como Bernard é importante nesse momento de transição.

Se há algum problema pessoal entre treinador e algum jogador, a hora de resolver isso é agora.

Fred declarou publicamente que Mano Menezes não gosta de seu trabalho. Fosse eu o Mano, e no caso de o treinador entender que Fred é útil, convocaria e na apresentação chamaria para o cantão, como se dizia antigamente, e acertaria tudo cara a cara. Para não deixar dúvidas.

Num grupo de 25, 30 pessoas, principalmente formado por gente que ganha muito dinheiro e é bajulada todo o tempo, será impossível satisfazer a todos. Mas é fundamental deixar claro que o critério é somente técnico e pode até ser cometido algum erro, mas jamais uma injustiça.

Um comentário:

Anônimo disse...

Ótimo texto Noriega.

"Convocar é uma arte. Porque envolve algo que deve estar acima das opções pessoais de quem convoca, que é o coletivo."

Sobre essa afirmação, está minha dúvida. Quem convoca a seleção não tem nenhum interesse, ou, não atende interesses de outros? Coincidência (ou não) jogadores do Corinthians são convocados com frequência ( após a libertadores, antes não)e com o Santos não ocorreu o mesmo. O São Paulo não ganhou nada esse ano,tem um elenco forte(no papél) mas isso não se traduz em campo... Será o presidente da CBF o maior interessado em ajudar o clube do coração? Não gosto de fazer acusações levianas, mas são coisas que acontecem que se pensarmos um pouco mais a fundo, podem gerar dúvidas.

Abraço


Rodrigo